quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

O gosto amargo do açucar


Nas campinas de Lençóis, onde as jaguatiricas
disputam espaço com os lobos, é lá que o caipira fica.
Numa cabeceira d’água ele afoga suas mágoas
comendo queijo e canjica.

Se eu saio bater lagoas beirando rios e vazantes
só pego peixe pro gasto, apesar de ter bastante.
Eu vejo a mais de cem braças a seriema que passa
com seu andar elegante.

Naquele capão de mato, que cobre o rio caudaloso,
eu ouço o ronco dos bugios no entardecer preguiçoso.
O trio puído das pacas me faz lembrar que a caça
é um ato criminoso.

Às vezes saio a cavalo percorrendo os descampados,
surpreendo os veadinhos lambendo o cocho do gado.
Ao me vêem sobre o arreio, os bichinhos com receio,
fogem pro mato fechado.

Mas como todo matuto eu também sonho acordado
e deste sono que durmo eu me desperto assustado:
Eu vejo um monstro que avança, faz de mim uma criança
com o futuro ameaçado.

Um deserto verde que cresce se expande pra todo lado.
A cada safra que passa, mais um inferno é plantado.
Leva tudo ao arrepio, destrói nascentes de rios,
campos, matas e cerrados.

Pensando só em dinheiro, essa grande prostituta
segue invertendo valores, vencendo todas as lutas.
Essa é mais uma denúncia que faço em minhas andanças,
sentindo em minha garganta o gosto amargo do açúcar.

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